Se esse silêncio capacitador é tão persistente, por que Erdogan escolheu esse momento específico para intensificar as aventuras militares? A resposta é simples: as eleições estão chegando e o governo, que supervisiona a pior crise econômica do país em duas décadas, conta com o jingoísmo como remédio para os males nacionais. O partido no poder intensificou as suas medidas contra os curdos, com prisão de políticos e jornalistascampanhas militares no exterior e proibição de concertos e peças de teatro em casa.
A invasão da Ucrânia pela Rússia aparentemente encorajou ainda mais Erdogan. Permitiu que a Turquia se apresentasse como amiga do Ocidente, ganhando elogios por seu bloqueio inicial do Mar Negro enquanto continuando a perseguir Está agenda repressiva. Além do mais, ao empurrar a Suécia e a Finlândia – percebidas como abrigos de longa data de militantes curdos – em direção à OTAN, a guerra deu à Turquia uma oportunidade de ouro.
Se os Estados Unidos pressionassem os dois países a aceitar as exigências da Turquia, como o secretário de Estado Antony Blinken sugerido pode acontecer, seria mais do que uma vitória do policiamento. Seria um raro triunfo simbólico. Bombardeamentos e proibições culturais não seriam nada comparados com uma admissão internacional, selada pelo país mais poderoso do mundo, de que os direitos curdos podem ser postos de lado.
É tentador ver a Turquia como um estado excepcionalmente belicoso. Rotulado o “homem doente da Europa” nos últimos dias do Império Otomano, o país agora parece ser o homem beligerante do continente. Mas é errado olhar para o país isoladamente. A agressão de Erdogan não é só dele. Ela é habilitada, encorajada e apoiada pelos países ocidentais, assim como pela Rússia.
Na Turquia, esta é uma afirmação provocativa: as autoridades querem que seus cidadãos e o mundo acreditem que “estrangeiros” e “potências externas” sempre apoiado separatismo curdo. Essa percepção da realidade bastante popular, mas altamente distorcida, não diz nada sobre o armas, suporte logístico e consentimento outros países têm abundantemente fornecido na matança de curdos.
Os Estados Unidos armas fornecidas aos curdos sírios durante sua luta contra o Estado Islâmico, é verdade. Mas isso é ofuscado pela sofisticação e quantidade de equipamento militar que a Turquia, lar do segundo maior exército da OTAN, assegura graças a fazer parte da aliança ocidental.
A verdade é que a agressão da Turquia andou de mãos dadas com a aceitação da OTAN, até mesmo com a cumplicidade. Não adianta os países ocidentais dando sermões à Turquia, ou a Turquia reclamando da hipocrisia ocidental: eles estão juntos nisso. Aconteça o que acontecer com a expansão da aliança – se os curdos são sacrificados no altar da conveniência geopolítica ou não – este deve ser um momento de clareza. Em um mundo de guerra, nenhum país tem o monopólio da violência.